Manter o agile no home office pode ser difícil, mas é possível superar os desafios. Veja como.
Você trabalha com agilidade há anos, mas em todo esse tempo nunca precisou fazer a gestão de times remotos. Se você está nessa situação, saiba que não está sozinho. O agile no home office foi uma realidade instaurada com a pandemia de forma abrupta para muitos agiles coaches e líderes. Por isso, tem gerado várias dúvidas e desafios.
Afinal, embora notoriamente bem preparados para mudanças rápidas de prioridades, boa parte do sucesso de times ágeis vinha atrelado à proximidade do tête-à-tête, à interação rápida e direta. Inclusive, foi desenhado para isso. Basta lembrarmos do sexto princípio do Manifesto Ágil, que reza:
A maneira mais eficiente de transmitir informações para e dentro de um time de desenvolvimento é a conversa face a face.
Não à toa, há quem diga que o agile só funciona com times presenciais, que a coesão gerada pela proximidade é fundamental para desburocratizar processos, que times remotos não inovam, têm menos comprometimento e por aí vai.
Será que o home office não pode fazer parte de uma cultura agile bem-sucedida, então?
Nós pensamos que pode – e deve. O agile com times remotos faz sentido porque une estas duas tendências: metodologias ágeis e home office. Ambas ajudam organizações na aquisição e retenção de talentos, em inclusão, globalização e redução de custos. Isso não significa, no entanto, que organizações, e nos incluímos nisso, não tenham desafios em praticar agile no home office.
Neste post, veremos que desafios têm surgido no domínio da prática do agile no home office e, ainda, como endereçá-los.
Trabalho remoto: o novo normal
De acordo com um relatório da EY, mesmo após a situação crítica da pandemia do novo coronavírus passar, trabalhar remotamente será “o novo normal”. Isso porque, o levantamento mostrou que flexibilidade operacional, agilidade e outros benefícios conquistados durante o período de trabalho remoto são valiosos demais para as organizações.
No entanto, essa perspectiva de mudança no modelo de trabalho não agrada a todos os profissionais. Segundo a pesquisa da Slack, que entrevistou mais de 2.800 trabalhadores dos Estados Unidos, 45% das pessoas responderam que o trabalho remoto prejudicou o sentimento de pertencimento deles à equipe. Além disso, 23% disse que trabalhar remotamente é pior para a satisfação geral com o trabalho e 31% revelou que sua produtividade diminuiu.
Para que as equipes remotas se sintam menos desconectadas e ineficientes, algumas empresas vêm apostando no trabalho assíncrono como uma solução.
Sem esperar retornos imediatos e fazendo suas jornadas em horários flexíveis, o profissional realiza suas entregas conforme o combinado. Afinal, a tecnologia possibilitou que as equipes operassem de forma coesa, sem que todos estivessem no mesmo lugar e ao mesmo tempo.
Entretanto, para essa prática funcionar é necessário que a comunicação seja extremamente eficaz. E, neste sentido, os times ágeis já possuem um nível de maturidade alto, por isso, é mais fácil se adaptarem ao trabalho remoto.
O que os times ágeis remotos fizeram para se adaptar
Contudo, é seguro afirmar que a mudança repentina para o trabalho remoto, devido a pandemia, impactou a maioria das equipes ágeis. De acordo com o que revelou o relatório do Gartner, publicado no primeiro trimestre de 2021, sobre 50 equipes remotas de desenvolvimento ágil, houve progresso em algumas atividades e retardo em outras.
Segundo a pesquisa, 92% das equipes estão escrevendo mais código em uma média de 10%. Entretanto, 63% dos times estão lançando com menos frequência, com o número total de lançamentos caindo para 21%. Em relação ao tamanho médio do lançamento aumentou em 64%, aumentando o risco e o tempo para valorização.
Os dados apontam ainda que antes da COVID-19, os lançamentos eram pequenos, frequentes e muito ágeis. Agora são lançamentos grandes, pouco frequentes e de alto risco, Porém, mesmo não sendo a situação ideal para equipes ágeis e remotas, trabalhar nessas condições é um desafio que deve continuar ainda por um tempo.
3 desafios mais comuns em agile no home office
1. Comunicação pouco dinâmica e baixo engajamento
A comunicação face a face, unida aos quadros e cartões, é a maneira mais eficiente de dialogar. É bem mais fácil fazer perguntas, trocar ideias durante a execução de tarefas e resolver problemas assim que eles surgem. Todos estão ali, acessíveis. E de maneira secundária, incluíamos as ferramentas online de colaboração, que nos ajudavam a elevar a efetividade dessa prática.
Trocamos esse mundo pelas conversas exclusivas em videochamada e chat, bem menos naturais do que as interações pessoais. Para começar, estar online não significa estar acessível nem disponível, aumenta o tempo de espera por resposta, uma só pessoa pode falar de cada vez, temos pouco contato visual para ler gestual e expressões, sem contar as distrações.
Tudo isso tende a baixar o nível de engajamento e de foco dos participantes, dificultando a obtenção de consensos e de colaboração. Se antes era só compartilhar na sala o problema de um para muitos ou trocar uma ideia de um para um, agora talvez seja menos estimulante e até menos efetiva essa troca.
Por isso, a artificialidade da comunicação a distância tem sido uma dificuldade bastante sentida por quem pratica agile no home office.
2. Falta de transparência e de conexão
Times ágeis, além de comunicativos, são bastante transparentes. Aliás, essa transparência é uma espécie de corolário da facilidade de comunicação.
Isso é extremamente informal. Ou seja, não é necessário uma agenda, nem muita pompa e circunstância para acionar alguém do time. Além disso, outra característica de times ágeis é o baixíssimo nível de documentação e a priorização de entregas sobre processos.
Porque as conversas se dão organicamente, nas cerimônias e nos quadros, envolvendo sempre todo o time, todos se mantêm na mesma página, integralmente informados e conectados, sem necessidade de recordar pontos já firmados.
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No agile em home office, essa transparência requer mais esforço. Unida à dificuldade de comunicação e à baixa documentação, pode fomentar a criação de mini-silos dentro do time e, automaticamente, a perda de conexão.
3. Perda de sincronia e colaboração
Manter a sincronia em times presenciais já é desafiador. Manejar problemas naturais de fluxo de trabalho como tempo de espera e bloqueios no backlog, assim como limitar o work in progress, quererem boa dose de jogo de cintura de agile leaders.
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Em home office, esse ritmo sincrônico entre os membros do time tem se mostrado ainda menor, sobretudo quando o trabalho envolve a coordenação e colaboração de vários profissionais, como designers, desenvolvedores e testadores.
A tendência é que os profissionais se sintam mais confortáveis e, por isso, fiquem inclinados a priorizar o trabalho que requeira menos colaboração de outros profissionais e mais esforço individual. Por um lado, isso pode significar uma tendência para o “do it yourself”, em que cada membro procura, antes de ir a outra pessoa, resolver os problemas por si só.
Por outro lado, isso também pode gerar a perda de conexão e de senso de equipe, o que pode cair numa geração de mini-silos dentro do time, de perda de entendimento e desconexão.
6 maneiras de lidar com os desafios da prática do agile em home office
Boa parte desses desafios, característicos de quem pratica agile no home office, podem ser resolvidos.
Nem tudo precisa ser modificado em relação às práticas presenciais, mas também nem sempre o que funciona no escritório funciona ou faz sentido remotamente. Muitas práticas não vão funcionar na simples emulação remota, mas precisam com modelos distintos ou até com a completa supressão da prática.
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Na verdade, práticas consolidadas no escritório ganham novos sentidos no home office. Então, é preciso repensá-las continuamente, tanto em função do tamanho do time e maturidade quanto de ferramentas e colaboração.
Veja algumas formas de contornar os desafios mais comuns na agilidade com times remotos:
1. Certifique-se de que os colaboradores têm em casa tudo de que precisam
Aqui falamos não apenas de ferramentas e outros equipamentos, mas de um espaço adequado. Evidentemente, a equipe perceberá com mais clareza o que precisa de fato ao longo do processo.
Além disso, o lugar onde cada membro da equipe mora é também o lugar em que trabalha, o que significa que o trabalho será parte da família e vive-versa, por mais que a separação seja recomendada e até desejada.
Saber se mover entre esses dois mundos com facilidade, mantendo a responsabilidade pelo trabalho e a auto-organização, também é uma habilidade que requer maturidade.
Estar atento a esse ponto e criar maneiras de gerenciá-lo é garantir que novos problemas não surjam.
2. Revise o fluxo de trabalho
Times ágeis sabem o valor de ferramentas tão simples quanto fundamentais: o diálogo, o quadro e os cartões, que vão garantir que o caminho para o objetivo da equipe seja trilhado, que as responsabilidades sejam compartilhadas e que a formação de silos não ocorra.
Essas ferramentas precisam ser emuladas no universo digital, de modo a serem acessíveis a todos os membros do time, fáceis de editar e de gerenciar, e ter relevância. E aí vai do time optar por um Miro, Trello, Confluence ou JIRA.
Garanta que todos concordem com o canal, faça um bom refinamento do backlog para descobrir conflitos mais cedo, certifique-se de que todos têm entendimento do fluxo – eventos e expectativas em relação a entregas – e que a transparência seja mantida.
Para isso, pode ser necessário dividir um time de geralmente 10-15 pessoas em grupos menores, fazer mais reuniões ou prolongar as já existentes, e acompanhar mais de perto o trabalho.
3. Estabelecer novas regras para comunicação e cooperação
Falamos que disponibilidade, acessibilidade e clareza da comunicação de membros de times remotos é diferente, o que enseja a construção de regras distintas e de novos combinados, como:
- Limitar o número de ferramentas para comunicação às mais efetivas: o time não precisa ter Slack, Asana, Jira, Skype, Whatsapp, todos juntos.
- Exercitar a conversa clara, em vez de suposição.
- Assumir sempre a boa-fé dos colegas, mesmo quando a fala parece torta.
- Compreender como os outros preferem se comunicar.
- Ser claro com respeito à disponibilidade por meio de um “status de foco” que deixa os demais saberem se você está aberto a interrupções menos urgentes.
- Usar o vídeo.
4. Ter uma única fonte de verdade
Já falamos acima: embora a prioridade seja a entrega não a documentação, talvez documentar mais seja uma solução para times remotos.
Times remotos não podem fazer um esboço rápido num quadro antes de trabalhar em um conceito complexo. Em vez de fazer com que os times de desenvolvimento e de testes tenham que adivinhar as nuances que, antes, seriam passadas verbalmente, documentá-las e oferecer as respostas antes do teste pode acelerar o processo.
5. Mostrar-se presente e fortalecer vínculos
A construção de confiança, comprometimento e responsabilidade mútua é pautada no fortalecimento dos vínculos e na transparência. Nós sabemos que isso não se constrói do dia para a noite, nem pontualmente.
No agile remoto, líderes precisam ser ainda mais proativos em relação à proximidade e a seu papel de guia nessa construção.
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Na prática, isso significa procurar ativamente por oportunidades e espaços que o time se divirta em conjunto, cadências mais frequentes de 1:1 e retrospectivas em equipe regulares.
6. Adaptar mentorias e desenvolvimento individual
Embora a adoção das ferramentas adequadas possa ajudar a manter a performance de times agile em home office, elas não vão transformar um time com baixa performance em um time com alta performance.
Por isso, manter o ambiente de aprendizado, com a introdução de novos conceitos e técnicas para expandir a colaboração e o desempenho, será ainda mais necessário no contexto de home office.
A aplicação de team building pode fazer sentido aqui também, como ferramenta para fortalecer a confiança nos outros e em si mesmo.
Agile no home office: ultrapassando a curva J
É preciso reconhecer que as novas condições de trabalho vão requerer ajustes e têm seu devido tempo de aprendizado.
Sua equipe ágil podia trabalhar com a maior coesão e sincronia antes da ida para o home office. Isso não foi perdido com o home office, mas modificado, no sentido de moldar as práticas agile para servirem ao time.
Vimos que agilidade é questão de comunicação, principalmente. No home office, portanto, a maioria dos problemas estão vinculados a minimizar o caráter distribuído do time, que conduz naturalmente a diminuição de engajamento, colaboração e confiança.
Por fim, lembre-se: ser ágil é, mais do que seguir práticas ágeis, reconhecer quando e como mudar. Construa, meça, aprenda e recomece esse ciclo novamente.
Quer ajuda nesse processo? Nossos agiles coaches podem auxiliar você a trilhar esse caminho!