Apesar de buscarem a estabilidade, empresas não podem mais se dar ao luxo de perder de vista a inovação na crise
A pandemia trouxe consigo muitas mudanças. Mas, apesar das vários oportunidades que essas mudanças possam ter gerado, a incerteza tem feito com que muitas organizações parem de olhar para o futuro e, consequentemente, para a inovação durante a crise.
Até certo ponto, elas têm razão. Até porque o trabalho não foi pouco. Quando não paralisadas, as operações tiveram que ser ajustadas a fim de proteger quem precisou continuar indo para a empresa ou então entrou em home office. No âmbito da gestão de pessoas, isso levou a novos modelos de trabalho, para o qual em muitos casos a infraestrutura precisou ser criada do zero. E, ainda, em termos de negócios e vendas, muitos viveram, junto com uma queda vertiginosa nos negócios, a necessidade de investir em novos canais, tanto para gerar demanda quanto para atender clientes.
Assim, justificativas não faltam para o conservadorismo quanto a investimentos em inovação. O declínio da busca por inovação nesse contexto, com exceção de setores como o de saúde e o farmacêutico, não distingue segmento nem porte da organização. Todo mundo foi impactado.
No entanto, como já diria Albert Einstein, a criatividade nasce da angústia e, portanto, é da crise que nascem as invenções, descobrimentos e grandes estratégias. Já, para Steve Jobs, nem crise precisava para ele produzir: para ele, a Apple estava sempre a 18 meses da falência.
Precisamos nos manter criativos quando tudo vai bem e, principalmente, quando tudo vai mal. Para algumas organizações, ademais, cujos serviços perderam a relevância com a crise, essa pode ser a única opção.
Mas como conciliar todos os impactos da pandemia com a inovação? É o que veremos neste post.
Para isso, vamos desenhar, a partir de duas pesquisas, a percepção no Brasil e no mundo sobre a inovação durante a crise. Depois, vamos responder que tipo de atitude adotar diante de tais percepções. Por fim, vamos entender como conciliar a necessidade de encontrar a estabilidade com a de pivotar. Como bônus, fecharemos com uma seção sobre inovação em tempos de crise e de home office.
Percepção sobre inovação na crise, no Brasil
Segundo o ACE Innovation Survey 2020, 66,7% dos entrevistados afirmaram que suas empresas estão sendo impactadas negativamente pela pandemia. Por isso, destes, 55% estabeleceram metas financeiras mais conservadoras e 38,9% estão com projetos de longo prazo pausados.
Quando se trata de expansão, a pesquisa mostra que os projetos devem focar apenas em mudanças incrementais: ou para melhorar sua atividade principal ou para levar seus produtos a mercados adjacentes.
Poucos (27%) estão com algum tipo de projeto de inovação disruptivo, que coloque seu próprio negócio em risco e, nesse caso, ele é no mais das vezes de médio prazo.
Apesar disso, a mesma pesquisa mostra que a inovação é importante para 80% dos entrevistados, o que prova o quão necessária ela é para os executivos, mesmo em tempos de crise, para proporcionar crescimento.
Percepção sobre inovação na crise, no mundo
O quadro mundial não difere muito do brasileiro.
Segundo a McKinsey, 75% dos executivos acreditam que a pandemia oferece várias oportunidades de inovação, mas poucos se sentem preparados para persegui-las.
Vejamos os dados: apenas 21% acreditam ter a expertise, os recursos e o compromisso para crescer com sucesso nesse ambiente.
No mundo, como aqui, dizem o consultores da McKinsey, os executivos estão conservadores: eles estão preocupados em manter a continuidade de seus negócios principais. Para tal, vão ponderar custos, produtividade e medidas de segurança. Tudo isso, antes da inovação.
Não por acaso, os investimentos em inovação estão sofrendo, com queda de foco de 32 pontos percentuais em relação ao período pré-pandemia.
Inovação: agora mesmo ou melhor esperar?
No quadro brasileiro, desenhado pela ACE, a busca pela inovação está concentrada no médio prazo, com 74% dos respondentes indicando que têm projetos com essa perspectiva.
Na análise mundial da McKinsey, o cenário é o mesmo. A expectativa é retomar iniciativas em inovação assim que o mundo e seus negócios se estabilizem e que o nível de incerteza diminua. Ou seja, nada de inovação na crise.
Será que essa é a melhor resposta ao momento? Segundo a McKinsey, não. Entender as oportunidades atuais e gerar inovação significará criar vantagens a longo prazo e, logo, crescimento e performance pós-crise. Sobretudo para as organizações que não podem mais operar como operavam por terem perdido o sentido. Sua simples sobrevivência requer inovação. Para o crescimento, elas precisão de um pouco mais.
A consultoria cita, ainda, que organizações que conseguiram manter seu foco em inovação após a crise de 2009 emergiram mais fortes, superando numa margem de 30% o mercado durante os três a cinco anos seguintes.
No entanto, reconhece: inovar não é algo trivial nem em tempos normais e nem para companhias bem estabelecidas. Que dirá então da inovação em tempos de crise e, ainda, em organizações que não tem perfil inovador?
Roadmap para a inovação na crise
A McKinsey adota um roadmap para inovação em tempos de crise. Vejamos:
1. Aspirar
Tem a ver com a definição de um Norte ou um Moonshot, com a visão que norteia a organização.
Deve ser incluída nas metas de performance, do contrário todos buscarão apenas o seu número, achando que essa aspiração é trabalho de outra pessoa.
Então, é fundamental quantificar essa aspiração em termos de crescimento e inseri-la dentro do planejamento estratégico, para que se desdobre adequadamente em projetos inovadores por toda a organização.
2. Descobrir
Durante as crises, há pouca clareza sobre a forma que as coisas vão tomar quando começarem a se estabilizar. A atitude inovadora ideal nesse momento é, portanto, a de descoberta: do que importa para os clientes, de acordo com seu comportamento de consumo e gasto.
Isso não é função de uma única pessoa ou cargo, mas uma tarefa da organização. Olhar para os colaboradores pode ser crucial: 69% dos respondentes da pesquisa da ACE disseram que sua principal fonte de inovação está neles.
Para as grande organizações, é hora de olhar para além da inovação como a criação de novos produtos, mas em sua ligação a modelo de negócio. Natualmente, elas relutam nesse sentido até que estejam visivelmente ameaçadas.
3. Desdobrar
Aqui é preciso separar ruídos de verdadeiros sinais, ou seja, de descobrir o que provavelmente vai se sustentar depois da crise e o que a organização pode conquistar realizando essa hipótese.
Isso implica entender e avaliar que posição assumirá no mercado, que tipo de modelo de negócio gerará valor, que projetos vão validar suas hipóteses.
4. Escolher
Momento de reconstruir o portfólio de inovação baseado nos achados anteriores. Esse é um grande desafio, sobretudo para grandes organizações, que não carecem de ideias mas de dificuldades de priorizá-las.
Criar certos limites, em termos de espaço que podem ser explorados, dará direcionamento, além de trazer à tona análises mais estratégicas.
Isso facilitará a realocação de recursos às melhores oportunidades com as melhores hipóteses.
5. Acelerar e escalar
Vimos fabricantes que produziam piso passaram a produzir máscaras e empresas de cosméticos fazendo álcool em gel, mas o que isso provou? Que elas são capazes de pivotar, se necessário, e muito rápido.
Os riscos são inerentes a esse processo, então é fundamental somar formas de lidar com ele. Além disso, elevar o nível de transparência e de governança, para que mecanismos da própria organização não impeçam a aceleração do projeto, mas se imponham na medida exata para que a inovação não leve a riscos desnecessários.
6. Estender e mobilizar
Por fim, unir-se a parceiros externos, a fim de reunir habilidades e talentos que a organização não dispõe, compartilhar custos e novas rotas de inovação, puxando o desenvolvimento do ecossistema originado pela inovação.
Trata-se de olhar para a inovação sob um ponto de vista mais sistêmico, dentro de uma estratégia maior de inovação.
Extra: inovação em tempos de crise e no home office
Qual o impacto do home office sobre a inovação? De acordo com entrevistas que CEOs serem ao The Wall Street Journal, eles acreditam que pode ser grande. A preocupação, segundo eles, é que a falta de interação e contato inerente ao modelo retomo acabe minando a habilidade de inovar das empresas.
De fato, vivemos uma fatiga de videoconferências. Pensar que a Próxima Grande Ideia venha de uma delas pode ser otimismo demais. No entanto, se grandes ideias já vieram de garagens e de conversas despretensiosas em um café, por que não?
Não faltam exemplos disso em organizações que têm colaboradores remotos em diversas parte do mundo, diferentes fuso-horários e línguas. Elas fazem do limão uma limonada, aproveitando as vantagens logísticas, explorando as ferramentas de que dispõem e novas, e criando mecanismos para manter o foco.
O planejamento inclui preparar uma pauta para a reunião para enviar a todos os participantes junto com outros materiais para leitura; limitar o número de participantes e o tempo de reunião; solicitar que todos fechem seu e-mail e deixem seu celular a distância; usar quadros compartilhados; e ao final fazer um fechamento retomando ponto a ponto o que foi discutido e o que deverá ser feito pós-reunião etc.
Inovação em tempos de crise enquanto se constrói estabilidade
Como vimos a partir das duas pesquisas, apesar de os executivos terem adotado – com certa razão – uma atitude conservadora em relação à inovação durante a pandemia, será fundamental, tanto para se manterem relevantes quanto para crescerem, pivotar por meio da inovação.
Claramente, um equilíbrio precisará ser mantido, a fim de não expôr a organização a riscos desnecessários.
E você, seus esforços atuais têm incluído a inovação?
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